Por razões de limpeza e de alguma manutenção, mudámos temporariamente de alojamento práqui:
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Para todos os que fazem anos em Junho, aqui fica um poema belissimo do cabo-verdeano José Luis Tavares:
CARTA A MIM MESMO
NO DIA DOS MEUS ANOS
Como poeta nasci já quase canónico
(vede se isto não tem seu quê de cómico),
fazem-me quase um preto gentio camões —
não ligueis, que amanhã príncipe dos anões
serei. É certo que não errei o fio à vida,
seus corsos e naufrágios — fui mais fundo
que os demais? — em modo assaz rotundo
percorri-lhe as voltas, os sustos, a recaída.
Saberão vez alguma que nesta escura feira
tudo é sombra e deriva? Que nem as agudas
razões do pranto desvanecem esta surdina?
Não te iludas com os louros na cabeleira:
mais depressa se rirão das tuas agruras
dizendo «outro que não escapou à sina».
José Luís Tavares
"... Ah o medo vai ter tudo
tudo
(penso no que o medo vai ter
e tenho medo
que é justamente
o que o medo quer)
O medo vai ter tudo
quase tudo
e cada um por seu caminho
havemos todos de chegar
quase todos
a ratos
Sim
a ratos"
[Alexandre O'Neill, O Poema pouco original do medo]
De novo Cesariny
"Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco..."
"O dono de um talho foi surpreendido pela entrada dum cão dentro da loja.
Enxotou-o mas o cão voltou logo de seguida, Reparou então que o cão trazia um bilhete na boca.
Pegou o bilhete e leu: -Pode mandar-me 12 salsichas e uma perna de carneiro, por favor?
O cão trazia também dinheiro na boca, uma nota de 50 euros. Ele pegou no
dinheiro, pôs as salsichas e a perna de carneiro num saco e colocou-o na
boca do cão.
O talhante ficou impressionado e como já estava na
hora, decidiu fechar a loja e seguir o cão. Este começou a descer a rua
e quando chegou ao cruzamento colocou o saco no chão, pulou e carregou
no botão para fechar o sinal.
Esperou pacientemente com o saco na boca que o sinal fechasse e pudesse
atravessar.
Atravessou a rua e caminhou até uma paragem de autocarro, sempre com o
talhante a segui-lo.
Na paragem, o cão olhou para o painel dos horários e sentou-se no banco,
à espera o autocarro.
Quando um autocarro chegou, o cão foi até à frente para conferir o número e
voltou para o seu lugar.
Outro autocarro chegou e ele tornou a olhar, viu que aquele era o número
certo e entrou.
O talhante, boquiaberto, seguiu o cão. Mais adiante o cão levantou-se,
Ficou em pé nas duas patas traseiras e carregou no botão para mandar parar o
autocarro, tudo isso com as compras ainda na boca.
O talhante e o cão foram caminhando pela rua quando o animal parou à porta
de uma casa e pôs as compras no passeio.
Então virou-se um pouco, correu e atirou-se contra a porta.
Tornou a fazer o mesmo mas ninguém respondeu.
Então contornou a casa, pulou um muro baixo, foi até à janela e começou
a bater com a cabeça no vidro várias vezes. Caminhou de volta para a porta
e, de repente, um tipo enorme abriu a porta e começou a espancar o bicho.
O talhante correu até ao homem e impediu-o dizendo:
"Deus do céu homem, o que é que você está a fazer? O seu cão é um
génio!"
O homem respondeu: "Um génio??? Esta já é a segunda vez numa semana que
este cão estúpido se esquece da chave!".
Moral da história:
Podes continuar a exceder as expectativas mas, aos olhos daqueles que te
avaliam, isso ficará sempre abaixo do esperado."
Neste dia de Abril, a aviação nazi bombardeou a povoação basca de Guernica,
Picasso imortalizou a brutalidade fascista no quadro com o mesmo nome
Durante três horas, mais precisamente entre as 16:30 e as 19:30, no dia 26 de Abril de 1937, os bombardeiros da Legião Condor, enviada por Hitler para ajudar as tropas do general Franco, na sublevação que originou a Guerra Civil de espanha (1936-1939), massacraram a pequena povoação basca de Guernica soltando 31 toneladas de bombas, muitas delas incendiárias
O bombardeamento custou um número elevado de vidas que segundo os historiadores, varia entre as 100 e 300
Pouco tempo depois da aviação nazi ter destruido esse pequeno povo Basco, Pablo Picasso realizou em 1937 uma pintura que se tornou um dos quadros mais célebres da história, e um grito de horror do pintor espanhol contra a guerra
Trata.se de uma obra mítica, a preto e branco, que mistura homens e animais com expressões atormentadas, Repare.se como a ausência de outras cores consegue um intenso dramatismo ao compor uma elegía que pretende descrever o caos provocado pela guerra, Um touro, que parece representar a Espanha, uma mãe que chora com o corpo inerte do seu filho nos braços, um soldado destroçado cujo braço conserva um bocado da espada, figuras deformadas, rostos contraídos, pedaços de membros, rodeiam a figura central de um cavalo, desorbitado e retorcido, com um mudo relinche de dor
Guernica converteu.se no símbolo da barbárie militar e dos horrores de uma Guerra Civil que destruiu a Espanha, causando mais de 500.000 mortos
No dia mundial do livro, deixo o conto mais rápido da história da literatura
"Cuando despertó, el dinosaurio todavía estaba allí" Augusto Monterroso
Retomo o poema de Jorge de Sena que nos devolve ao lugar pátrio, Esse tal canto de afectos que une o indígena ao húmus primordial
Tu és a terra em que pouso.
Macia, suave, terna, e dura o quanto baste
a que teus braços como tuas pernas
tenham de amor a força que me abraça
És também pedra qual a terra às vezes
contra que nas arestas me lacero e firo,
mas de musgo coberta refrescando
as próprias chagas de existir contigo.
E sombra de árvores, e flores e frutos,
rendidos a meu gosto e meu sabor.
E uma água cristalina e murmurante
que me segreda só de amor no mundo.
És a terra em que pouso. Não paisagem,
não Madre-Terra nem raptada ninfa
de bosques e montanhas. Terra humana
em que me pouso inteiro e para sempre.
De novo O'Neill,
" O meu marido saiu de casa no dia 25 de Janeiro. Levava uma bicicleta a pedais, caixa de ferramenta de pedreiro, vestia calças azuis de zuarte, camisa verde, blusão cinzento, tipo militar, e calçava botas de borracha e tinha chapéu cinzento e levava na bicicleta um saco com uma manta e uma pele de ovelha, um fogão a petróleo e uma panela de esmalte azul. Como não tive mais noticias, espero o pior."
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